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Durante muito tempo, a nutrição para o treino foi vista através de forma simplista: calorias para energia, proteínas para construção muscular e hidratos de carbono para reabastecimento. Contudo, assim como a nutrição personalizada, a ciência da nutrição desportiva evoluiu drasticamente.
Hoje, compreendemos que o impacto dos alimentos vai muito além da sua composição calórica ou de macronutrientes. Entramos na era da alimentação funcional e dos suplementos inteligentes, que otimizam o corpo a um nível celular, melhorando não só o desempenho, mas também a recuperação, a resiliência e a saúde a longo prazo.
Esta abordagem é um reconhecimento de que cada atleta, e cada pessoa ativa, tem necessidades bioquímicas únicas, influenciadas pela sua genética, tipo de treino, microbioma e até mesmo pelo seu ambiente. Não se trata apenas de "o que" comer, mas de "como" e "porquê" certos alimentos e compostos bioativos podem transformar a nossa capacidade de treinar melhor, recuperar mais rápido e alcançar novos patamares de saúde.
A alimentação funcional baseia-se na ideia de que certos alimentos, ou os seus componentes, têm benefícios para a saúde que vão além da nutrição básica. No contexto do treino, isto significa escolher alimentos que não só fornecem energia, mas que também reduzem a inflamação, otimizam a função imunitária, melhoram a digestão e apoiam a saúde mitocondrial, entre outros.
Aqui estão alguns pilares da alimentação funcional para atletas:
O termo "superalimento" pode parecer um modismo, mas refere-se a alimentos densos em nutrientes que oferecem um vasto leque de benefícios. Para quem treina, estes são aliados poderosos:
A incorporação destes alimentos na dieta diária pode ter um impacto significativo na capacidade do corpo de lidar com o stress do treino e de se adaptar.
O microbioma intestinal tem emergido como um jogador fundamental na saúde e no desempenho. Um intestino saudável significa melhor absorção de nutrientes, um sistema imunitário mais robusto e até mesmo uma melhor saúde mental. Para atletas, isto é crucial para:
Alimentos ricos em probióticos como iogurte natural, kefir, chucrute, kimchi e kombucha devem ser integrados na dieta. Em alguns casos, a suplementação com probióticos específicos pode ser benéfica, especialmente após o uso de antibióticos ou em períodos de stress intenso.
A indústria dos suplementos, tal como a nutrição, está a evoluir rapidamente. Longe vão os tempos em que uma abordagem "tamanho único" era suficiente. Agora, a tendência são as soluções personalizadas e baseadas em dados, o que chamamos de "suplementos inteligentes". Estes suplementos são desenhados para preencher lacunas específicas na nossa dieta ou para otimizar processos importantes no nosso corpo, com um objetivo muito mais direcionado.
É verdade que a proteína em pó e a creatina continuam a ser as estrelas da suplementação desportiva, e com razão, pois a sua eficácia para força e recuperação está mais do que comprovada. A creatina, por exemplo, é fantástica para dar aquele "boost" de energia rápida aos músculos, o que se traduz em mais força e potência durante exercícios intensos. Já a proteína, seja ela de soro de leite, caseína ou vegetal, é fundamental para reparar e construir os músculos depois do treino. Mas a inteligência agora está na qualidade desta proteína, no seu perfil de aminoácidos e até no momento certo para a consumir.
Os nootrópicos, são compostos que visam melhorar a nossa função cognitiva. Ou seja, ajudam-nos a ter mais foco, concentração e clareza mental. Embora não atuem diretamente no desempenho físico, a capacidade de manter a mente "afiada" durante treinos longos e desafiantes é, sem dúvida, uma grande vantagem.
Além disso, com o desgaste que o treino pode causar nas articulações e nos ossos, surgem também suplementos inteligentes focados na sua saúde e recuperação. O colagénio é crucial para a saúde das nossas articulações, tendões e ligamentos, e a sua suplementação pode ser um grande aliado na recuperação de lesões e na manutenção da estrutura do corpo. As Vitaminas D3 e K2 são essenciais para a saúde dos nossos ossos e para a absorção de cálcio, sendo que a Vitamina D tem ainda um papel importante na função muscular e na nossa imunidade.
A suplementação está a entrar numa era de personalização sem precedentes. Graças aos avanços significativos em diversas tecnologias e análises, já é possível identificar com precisão as deficiências específicas ou as necessidades metabólicas únicas de cada pessoa.
Os testes genéticos, por exemplo, desempenham um papel crucial ao revelar predisposições individuais a deficiências vitamínicas, sensibilidades alimentares ou a forma como o corpo de cada um metaboliza nutrientes específicos, como por exemplo a cafeína. Esta informação detalhada permite um ajuste extremamente preciso da suplementação.
Complementarmente, as análises de sangue e urina são fundamentais para detetar deficiências de minerais essenciais, como magnésio e zinco, ou vitaminas vitais como o ferro e as vitaminas do complexo B, bem como identificar desequilíbrios hormonais que possam comprometer tanto o desempenho físico quanto a recuperação.
Além disso, a monitorização através de dispositivos wearable, embora muitas vezes associada à alimentação, fornece dados valiosos sobre padrões de sono, níveis de recuperação e stress. Estas informações podem indicar a necessidade de suplementos que apoiem diretamente estas áreas, como o magnésio para melhorar o sono ou adaptogénicos para gerir o stress.
Com o objetivo de ultrapassar a abordagem tradicional de "tentativa e erro", diversas empresas estão ativamente a desenvolver plataformas inovadoras. Estas plataformas integram todos estes dados para oferecer "packs" de suplementos altamente personalizados ou, em casos mais avançados, recomendações em tempo real, baseadas em evidências individuais e concretas.
A revolução na nutrição desportiva não é isolada. Ela prospera na sinergia entre a alimentação funcional, a suplementação inteligente e as capacidades de monitorização e análise que a tecnologia moderna oferece. Imagina um cenário onde o teu smartwatch deteta um padrão de sono deficiente e, com base nos seus dados genéticos e de microbioma, uma aplicação de IA sugere não só alimentos ricos em triptofano, mas também a dosagem ideal de um suplemento de magnésio específico para ti.
Esta abordagem integrada significa que a nutrição para o treino se torna proativa, identifica e corrige problemas antes que afetem o desempenho. Ajusta-se às mudanças nas necessidades do corpo e do treino e maximiza os resultados porque é baseada em dados individuais.
É crucial sublinhar que, apesar de toda a tecnologia e inteligência envolvidas, a orientação de profissionais de saúde continua a ser indispensável. Nutricionistas desportivos, médicos e fisiologistas do exercício são essenciais para:
Os profissionais de saúde não são substituídos pela tecnologia; são empoderados por ela, usando-a como uma ferramenta para oferecer um cuidado ainda mais preciso e individualizado. Eles tornam-se os arquitetos que montam as peças do puzzle de dados em um plano coeso e seguro.
A era da alimentação funcional e dos suplementos inteligentes está a redefinir o que significa nutrir o corpo para o treino e a recuperação. Com a crescente compreensão do poder dos superalimentos, da importância vital do microbioma intestinal e da capacidade de personalizar a suplementação com base em dados genéticos e fisiológicos, os atletas têm agora ferramentas para otimizar a sua performance e longevidade.
Uma realidade que já está a capacitar indivíduos a ir além dos seus limites e a transformar a sua relação com a comida e o treino. Ao abraçarmos esta evolução, estamos a abrir caminho para uma era onde treinar com propósito significa nutrir com inteligência, garantindo que o corpo não só aguenta as exigências do exercício, mas prospera em todos os aspetos da saúde.
Artigo escrito por Maria Luísa Franco, Nutricionista do Fitness UP, formada pela Faculdade de Ciências da Nutrição e da Alimentação da Universidade do Porto, especialista em Nutrição Desportiva e com mais de 10 anos de experiência na área.
